E aí, amiguinho do coração... Saudades? Opa, maravilha.
Ah, meu caro, como sinto falta das nossas conversas. Sempre
tão agradáveis... Sim, estou viciada em “nós”. E é bom demais dizer isso.
O tempo resolveu colocar seu melhor par de tênis e correr
alucinado, como se o mundo fosse acabar antes da Sessão da Tarde. Acontece que
eu não sou muito fã de rapidez... E acontece que o tal do tempo não se importa muito
com isso.
E já que os ponteiros andam fazendo cara feia para mim, é
melhor encurtar a conversa e ir direto ao ponto sem esses rodeios que só servem
para debochar da capacidade humana de se entender uma história. As notícias que
tenho para dar são boas. Começaram ruins, mas agora são boas. Eu garanto.
Caro amigo, o mês terminou com algumas lágrimas na
madrugada. Aquela situação complicada em que o creme noturno se mistura com as
secreções que servem para limpar a vista, mas acabam por invadir os poros e
desmanchar a alma, que já anda meio sonolenta. Bom, pelo menos posso dizer que
chorar cansa. É melhor assim... Sabes que não curto rolar o corpo no colchão no
embalo da inquietude. Não sei o motivo do choro. Talvez faça parte de algum
distúrbio hormonal que toda mulher conhece bem. Ah, sim, você não é uma mulher... É
um belo detalhe. Mas acho que me entende. E aí chega uma hora em que você enche
os pulmões e prepara um berro qualquer – quando digo “qualquer”, quero dizer
que a qualquer hora a infeliz vibração vocal vai pousar nos ouvidos alheios e
fazer estragos incalculáveis. Pensei em abraços imaginários nas horas difíceis.
Falei com Deus – os chatos dizem que falei com as paredes, mas se assim for,
quem disse que Deus não pode estar nas paredes? Pois é. Juntei as mãos, fiz
preces, cantei, sacudi as pernas para a dor passar... Não queira imaginar a
cena. Prefiro apenas descrever diminuindo o que puder... É mais elegante.
Mas aí veio o milagre. Bom, acho “milagre” uma palavra
pesada demais... E ando dispensando pesos. Prefiro dizer que uma luz se
acendeu... Não. Místico demais. Quem sabe não seria melhor falar sobre a
bonança que vem depois de toda tempestade? Ok. Pois é... O sol
raiou. Não muito, pois as previsões meteorológicas não suportam metáforas extraídas
de letras de canções melosas. Os últimos dias não se decidiram entre os óculos
de sol e o guarda-chuva. A verdade é que eu acordei – não tão cedo como queria,
não tão tarde como antes fazia. Abri as cortinas, deixei a luz entrar, matei os
ácaros, arrumei a cama, desfiz as olheiras... E fui em frente. Disposta, sempre
– não me pergunte de onde veio a vontade de não me afundar na cama. Sabe, meu
nobre, gosto dessa sensação. Não suporto o breu. A sombra não é pra mim.
Então... É melhor estalar os ossos e partir para o ataque, não acha?
E assim foi feito. Choro bem menos agora – apenas com
propagandas de dia das mães e bebês, porque eu já devo ter dito que a
aproximação da fase adulta tem aflorado ainda mais a minha sensibilidade. Não
havia dito antes? Ah, não importa.
Acho que a luz está em saber que a vida
recomeça a cada dia... Mesmo que alguns dias nos levem a prestar atenção no
quanto a nossa cama pode ser confortável – as segundas-feiras são experts nessa
tarefa. Meu bom, o dia nasceu – claro, escuro... É vivo. É estrelar, estrelado,
estalado, instalado no calendário. E a cada novo dia, aguardo surpresas.
Confesso que é esta mania que me move. Bom, sinto-me feliz por ser movida por
alguma coisa.
Meu caro, não vamos cair no clichê. Mosquitos mordem meus
dedos enquanto escrevo. Parece que nem eles me aguentam mais. Prefiro achar
graça deste fato, é mais interessante.
É por isso que falo: não sei aonde vou parar com o que digo.
Mas em algum lugar eu hei de chegar. E lá eu te encontro. Riremos de nós
mesmos, da nossa distância tão atual, porém tão antiga no futuro. Vamos brincar
de... De nos esquecer em qualquer lugar. E aí, quando as gavetas do nosso
cérebro resolverem fazer uma faxina... Aí a gente bate na parede, conta até
três e diz com quem está o pique.
As saudades ainda existem. As esperanças de que um dia elas
vão morrer também.
(Ouça Do teu lado, Leoni)
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