"O fanatismo é a única forma de força de vontade acessível aos fracos." (Friedrich Nietzsche)
Não gosto de começar posts com citações, acho que deixa esse blog com uma cara de Tumblr. Mas foi inevitável. Falar sobre uma característica de fraqueza que todos carregam é algo difícil demais, principalmente quando a tarefa cabe a um blog de descomplicação. Bom, estamos aqui para tentar... Vamos lá.
Pensemos juntos: cada um tem uma alminha. Bonitinha, cheia de frescuras, de profundidades, predicados... Mas são alminhas. Diminuídas. Pequeninas, sabe? Como cachorros. A gente alimenta com sentimentos, pensamentos e ideias, descuida em relação à sujeira que faz, dá banho, dá carinho, reclama quando faz muito barulho... E quando morre, a gente morre também. Podem vir outros bichos, pessoas, novidades... Mas nunca mais seremos os mesmos. E então, iludidos, precisamos continuar vivos, de pé, erguidos... Porque o diminutivo que nos definia foi embora – ou nem foi, nós é que esquecemos. O diminutivo morreu, mas o aumentativo é maior e mais forte. Então, ora, encontra-lo é preciso.
O desespero é grande. Em todo lugar, vemos algo que nos deixa melhor. É sério, ficamos alucinados, nós e nossas mentes vazias querendo descobrir algo ou alguém que nos descodifique, que nos dê motivos para acordar todas as manhãs, algo ou alguém que nos descreva, nos defina... Porque nós não sabemos nos definir. E sabe como é, “não tem tu vai tu mesmo”, lembra?
Uma música, por exemplo. Quando seus ouvidos cismam com uma canção, não há nada no mundo que te tire da neurose que você entra. E quando você cisma com um artista? Digo, por experiência própria: você fica tão incontrolavelmente chata que não se aguenta. Passa da fase da admiração e parte para a obsessão – opa, essa palavrinha merece um parágrafo com ar de depoimento sobre algo que foi ou é vivido por qualquer mortal, até por quem vos escreve.
Quando gosta-se de alguém, de verdade. Uma verdade tão estanha que deixa de ser verdade. Perdem-se noites, dias, e você lá, se virando na cama, sem dormir, pensando apenas no conto de fadas que “vive-se” – bota um par de aspas bem bonitinho, isso. Paixão. Platônica, ainda por cima, porque só a filosofia é capaz de descrever a encrenca em que você se meteu. Platão diz que o amor possui degraus para descrever o significado do amor que se sente. Se ele tivesse Tumblr, ia fazer o maior sucesso. Como se amor pudesse ser medido, né, seu Platão? E de onde foi que saiu essa teoria tão louca, cá pra nós? Mas acho que entendo Platão. Quem sabe o que é sentir algo de uma forma obsessiva entende todos os filósofos do mundo – dizem que a vida amorosa do pessoal daquela época não era das melhores, percebe-se. Porque quando há encanto demais, é impossível fazer a coisa andar. A blogueira aqui aprendeu que o amor não mora na discografia do Jorge Vercillo, e se morasse, mesmo gostando muito dele, eu partiria para outro sentimento, porque não ia aguentar. Amor é coisa séria demais para ser tratado na base do perfeccionismo. Mas falar de amor eu já falei, e cansa, porque dá uma dor de cotovelo... Brincadeirinha.
Não fujamos do assunto. As palavras aqui presentes devem falar sobre a fraqueza humana que arranca a cabeça dos seus pobres portadores. O fanatismo. Ele existe no amor, na TV, na cabeça, no coração... E o que fanatismo tem a ver com aquele papo da alminha? Explica-se: o diminutivo ao qual me refiro nada mais é do que a nossa infância. Ô saudade daquele tempo em que o maior dos meus problemas era o cálculo de “arme, efetue e tire a prova real” que a tia Alzilene passava – as contas eram enormes, tá? Porque é na infância que estão os nossos primeiros valores, nossas ideias, os nossos sentimentos... Ou seja, a nossa alma mantém as configurações originais de fábrica, não tem nenhum botão fora do lugar ou programa pirata invadindo o sistema – arranhões no joelho não contam como uso irresponsável do produto, é apenas uma normalidade, assim como um pé sujo de lama ou uma roupa manchada de chocolate. É quando a gente cresce que começa a fazer alterações no sistema, com o intuito de melhorar ou simplesmente imitar seu irmão mais velho e dizer: “olha, eu também namoro” ou “a minha mesada é maior que a sua”. Quando a gente começa a crescer e percebe que a infância não dura para sempre, a situação aperta, e seja qual for a circunstância, o problema mostra-se quando menos se espera. Você tem problemas maiores, a vida te cobra mais (“a vida” pode ser “seus pais”, ok?), o tédio é inevitável. Todos dizem que já passaram por essa fase, mas vai perguntar se foi fácil, vai! Não, ninguém consegue sentir o que você sente. E então você ouve aquela música, com aquela voz que você queria ter, daquele artista que você queria ser... Não é inveja, é simplesmente um espelho que você queria ter em casa, ou seja, alguém que você queria ser. Ou pode ser um sonho. O tal sonho aperta o botãozinho “prioridade alta” e desregula tudo. “São hormônios, meu filho”. “Jura? Quer dizer então que meus problemas se resolvem com um sono eterno elaborado por uma cartela de rivotril?”. E dá pra dormir até os 20 anos? Bom, isso só adia o problema, vai por mim
Mas é isso que eu já disse e repito: ninguém consegue sentir o que você sente. Nem mesmo a música mais linda que você já ouviu: as palavras são as mesmas, mas será mesmo que o John Mayer estava enfezado com a escola quando escreveu “I want to run through the halls of my high school, I want to scream at the top of my lungs”? (vai no Google tradutor que ele aperta a tecla sap, só não garanto a integridade da gramática que aquela mulher com voz estranha pode ter). As palavras podem ser lindas, os exemplos podem ser lindos... Pode até ser que o sentido seja o mesmo, mas só nós sabemos o que sentimos. E se tem uma coisa que eu gosto nesse tal de sentimento é esse negócio dele ser único e insubstituível.
Eu sei, fazemos muitas besteiras quando hiperbolizamos nossos sentimentos e pensamentos, mas o lado bom de tudo isso é saber que, quando mais cedo essa onda de calças coloridas e óculos sem grau for vivida, mais cedo vai vir a risada dos vinte dizendo: “querida, você gostava mesmo daquela bandinha?”. Até a ilusão, por mais perturbadora que seja – e olha que a blogueira tá aqui pra afirmar isso – tem seu lado bom. E se for nesse tal de amor, companheiro... Vai que o tempo te pega de jeito e pergunta: “pronto, amadureceu? Porque tem um segundo round esperando”.
Mas o cuidado para não perder a cabeça deve ser redobrado. Se não, achar nossa “alma” fica impossível. E essa tal “alma” é a nossa caixa preta, é o que realmente nos descreve, sem precisar de voz ou violão. Então, sejamos adultos... quando for preciso. Por enquanto, deixa eu ser assim, louca, deixa eu ficar fantasiando a vida no meu canto, relax... Depois dessa fase, acho que a fantasia mais saudável que teremos é a do carnaval.
Ah, esse papo não acaba por aqui. Aguardem surpresas, pois nossa descodificação vai ficar mais elaborada ainda.
(Suzan Kare)
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